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Espero que esta seja a última carta de Amor que te escrevo.

A vida é engraçada!
Já achei que o nosso Amor só existia na minha imaginação,
já achei que nem sabes que existo,
já achei que podíamos ficar juntos para sempre,
já estive a um centímetro de te dizer do meu Amor.
Já achei tudo sobre ti e sobre nós, e às vezes tudo ao mesmo tempo.

Não deixei de te amar, nem sei se alguma vez deixarei, mas acho que finalmente me resignei a viver-te ao longe.
De hoje em diante vou deixar-me viver sem esperança de que alguma vez sejas minha.
Honestamente, se eu nos olhar sem a distorção poética do Amor, terei que reconhecer que nunca me soubeste perto e, apesar de estar sempre na tua sombra, também sempre estive escondido pelo medo de não te merecer.

Há tristeza em deixar-te ir,
aquela tristeza de saber que tem que ser, mas ainda assim não querer
a tristeza do frio
mas também há a liberdade de poder Amar-te sem desejo. Os sábios que dizem que só esse é o verdadeiro Amor, mas há algo em mim que não te quer amar como a Deus ou às crianças.
Esse bocado de mim quer-te mulher, quer a tua pele e o teu cabelo a respirar por perto. É essa parte que acaba hoje. É hoje que desisto de te querer e passo só a Amar-te.
O Sábio diz que só isso importa… mas eu não sou sábio.

Deseja-me sorte, vou precisar.

Setembro 2016

Abdul Sattar Edhi

Hoje o Google decidiu homenagear Abdul Sattar Edhi.abdul-sattar-edhi
Aproveitem para descobrir o que é ser humanista.
Este homem é muito mais importante do que qualquer outro político dos últimos 20 anos.
Nenhuma cruzada, guerra santa, Jihad maior ou menor, faz sentido quando vemos o mundo sob os olhos deste homem.
Aprendam o que é ser alguém, leiam um bocadinho sobre Abdul Sattar Edhi e, melhor ainda, tentem copiar-lhe o exemplo.
Há-de chegar o dia em que os estúpidos vão deixar de ter medo de coisas como الله اكبر e vão passar a julgar a violência pelo que ela é e não pelo aspecto que têm os que não a praticam.

o dia que ficou sem coragem

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O dia em que ficou sem coragem
foi porque a luz faltou.
Assim. Sem mais, nem menos, sem espaço… margem
de repente simplesmente se apagou
Teve dois segundos de pânico,
brevíssimos momentos de ansiedade
mas de súbito acabou, ficou mecânico
desprovido de humanidade.

Dada a desimportânia de tudo.
todos os dias eram iguais todo o dia,
dizia palavras, mas parecia-se mudo
até as coisas inesperadas ele já sabia
Tudo passou a ser indiferente
cabelos compridos,
unhas cortadas rente,
rezas, gemidos
Tudo foi a mesma coisa desde aí
deixou de haver escalas
todas as notas eram mi
todos fizeram as malas,
e viajaram sem bagagem
enfiaram os pertences em barcos
e ficaram a observar da margem
como se ficassem com as setas e atirassem os arcos
como se depois, por não terem bens materiais,
tudo ficasse saldado:
– direitos iguais para os animais
– paridade entre punk e fado
– fim do crédito mal-parado
– distribuição equitativa do mau-olhado

Mas a grande revolução
foi o fim do cozido à portuguesa
Passou a fazer-se tudo à mão
rendas de bilros com malha chinesa
O comunismo foi apanhado a fundir-se com a Igreja
e quando pensavam que se pariria o anti-cristo
O resultado foi gases numa senhora de Beja
cujo ganha-pão eram estatuetas de xisto
tomou um comprimido e acabou-se o problema
Descobriu-se a Santa Igreja Comunicrática
tudo passou a ser culpa do sistema
e da electricidade estática
Todas as semanas se votava a existência de Deus
e quando havia patrocínio
a chuva tinha gás e açúcar e vinha mesmo dos céus
tudo era inovação… ou declínio

Daqui donde ele se olha as coisas não mudaram assim tanto
é a mesma alegria, a inveja, o queixume, o canto
morre-se e nasce-se das mesmas maneiras de sempre
esgota-se a morte, vem a vida
a vida passa num repente
e quando a olhamos foi colhida
não por aquele esqueleto com foice e andrajos negros meio-desfeitos
a vida dá o que tem e acaba, assim sem mais nada
e por mais largas avenidas ou caminhos estreitos
ter-se-á que seguir um dia a pé
pela mesma estrada
Importa pouco se chega de camião ou sapatilhas
não interessam os interesses
se está bem de saúde ou doem as virilhas
se fora sovina ou dera benesses

Importa o que importa
mas saber o que é isso
é tudo.

Ti, 26-01-2010

estúpido

No início os homens mais fortes perceberam que podiam derrotar os mais fracos. Depois os mais fracos descobriram a determinação e tornaram-se mais fortes do que os fortes.
Depois os que tinham sido derrotados perceberam que com pedras podiam atingir os fortes à distância e por isso a sua força tornava-se menos vantajosa.
Tudo isto foi no tempo em que o homem era ainda uma espécie de macaco.
Com o desenvolvimento do intelecto ficou tudo exactamente na mesma.
Quando as pedras venceram os punhos, descobriram os paus, e depois os ferros e depois as balas e depois as bombas e depois os mísseis…

Queremos sempre vencer os nossos inimigos. Queremos derrotá-los, ser mais fortes do que eles. Isso torna-nos mais musculados, mais precisos, mais eficazes e mais formidavelmente desumanos.
Responder a um estalo com um murro, é o mesmo que cuspir em quem merece. Ser humano é ser mais do que instinto natural, é ter consciência de tudo, é não matar quando a outra opção é morrer.
Não digo que consigamos ser sempre humanos, mas ter orgulho em ser estúpido é ser só isso.

Lógica da verdade

Fernando Pessoa«Os argumentos são, quase sempre, mais verdadeiros do que os factos.
A lógica é o nosso critério de verdade, e é nos argumentos, e não nos factos, que pode haver lógica.»

Fernando Pessoa

Nem uma palavra

todos lhe parecem estúpidos. E os que não são estúpidos, são perversos ou vegetativos

O profeta está ofendido.
No topo da montanha onde dorme há muitas centenas de anos, manda raios e coriscos que não acertam em lado nenhum.
Dali todos lhe parecem estúpidos. E os que não são estúpidos, são perversos ou vegetativos.

O ProfetaOs fortes mandam, como sempre, mas mandam sem pudor, sem moral e sobretudo sem medo. Nada de mal pode acontecer aos fortes, deixou de se contar como o heróico David tombou o invencível Golias. Já ninguém se lembra que bastou uma lâmina para Sansão ser o mais comum dos homens. Parece não haver razão para nada.
Impotente olha para o céu, onde O que manda não se deixa ver. Os que passeiam desenvergonhados no sopé da montanha dizem que Deus é grande, mas quase todos duvidam que sequer exista.

Outros há que dizem que Deus é infinito, mas é mais finita a fé do que o egotismo.
O profeta sabe que há dois tipos de homem: os que acreditam em Deus quando são tomados pelo desespero e os que deixam de acreditar em Deus quando o mesmo desespero chega, há ainda os que sabem Deus, que O sentem, mas esses são tão raros que nem contam.
O tempo do profeta já passou e não voltará nunca mais, porque ao contrário do que dizem os sábios, a história nunca se repete, é sempre diferente e não é evitando os erros do passado que se prepara o futuro. O futuro prepara-se com treino, bondade e o treino da bondade.

O profeta sabe que deve ser bom e condescendente, mas tivera ele o poder destruidor dos ventos ou das marés e teria arrancado pela raíz esses ervas daninhas que o usam para se acharem superiores. Aos que se acham superiores ao próprio profeta, apatanhá-los-ia só para saberem que não passam de um grão de pó agarrado a um sapato velho, aos que acham que o profeta é mais iluminado do que o Sol, esbofeteá-los-ia para verem como é tão vingativo e rancoroso como qualquer outro.