Chamar

Mando faxes, cartas, telegramas, e-mails, sinais de fumo, mensagens em garrafas!
Todos são surdos, ninguém sabe ler, todos são cegos.

Chamo-os.
Tanto e há tanto que ensurdeço, talvez por isso não me oiçam,
Talvez não oiçam ninguém por minha causa, talvez ninguém me oiça por culpa minha, talvez tenha tornado todos surdos.

Grito mais e mais alto, mas ainda assim
Nada; ninguém!

Mando faxes, cartas, telegramas, e-mails, sinais de fumo, mensagens em garrafas!
Todos são surdos, ninguém sabe ler, todos são cegos.

Desisto por fim, sabendo que ninguém me pode entender.

Só quando deixo de os procurar;
olho para mim, e hipotetizo que eu é que sou muda, eu é que sou surda, eu é que sou cega.

Eu é que nunca os entendi,
eu é que nunca lhes respondi.

Morreu-se-me

Enfim termina neste dia, o verdadeiro que tentei ser-te.
Ser-te-ei mais perfeito e útil, menos eu, mas menos inútil.
Deseja-nos sorte, vamos precisar
Tu tão tu e eu tão nada
temos ainda tanto que caminhar…

Sempre achei que não gostavas do que eu pinto porque terás mais talento do que eu
e por isso ser-te-ia penoso veres os meus trabalhos sofríveis.

Também sempre pintei mais do que tu, mas nunca melhor…

para mim pintar é um real prazer e, mesmo que por vezes me mova a esperança de um reconhecimento improbabilíssimo, a grande maioria das vezes pinto apenas por puro deleite, sem objectivo nenhum que não o próprio acto de o fazer.

Nunca fui, nem serei tão bom pintor como tu. Sabes como misturar as cores, sabes como e quais os pincéis a utilizar e consegues reproduzir exactamente o que a tua mente imagina.

Disseste-me: “Não pintes a esta hora, os pincéis fazer demasiado ruído para uma hora tão tardia”

Hoje descobri que não desgostas da minha arte
simplesmente a achas execrável
inferior, reles, inglória, inútil e sobretudo
incómoda e desconfortável
não com aquele sentido que os artistas gostam de dar,
aquele que indica que a arte é tão boa que só maus se sentem incomodados por ela.

Tu és boa.
e, por isso, o incómodo e desconforto da minha arte não é meritório,
é-te um pau de giz a zurrar num quadro de lousa,
é um talher a raspar aos gritos num prato.
É isto que te inflijo quando pinto.

Peço-te que me perdoes por querer alegrar-te da mesma forma que alegrei tantos antes de ti;
esses que me pediam desenhos e que me aplaudiam sem razão.

Fui arrogante ao pensar que poderia alguma vez soar bonito aos teus olhos,
esses olhos habituados a perfeição e beleza.
Não são essas as minhas formas e cores, nunca serão
por isso hoje aqui te juro que jamais me verás pintar
jamais te chegará algum quadro meu por minha mão.

Não posso jurar não pintar nunca, porque eu sou pintar
não posso afiançar que te nunca cruzarão o olhar cores da minha paleta
Mas se o destino assim quiser, não será por minha vontade ou mote

Terei em ti mulher, como até agora,
mas, como nunca antes, terei nas telas amantes
chegarei tarde, inventarei desculpas,
mentir-te-ei com todo o engenho que souber
Também não posso prometer que não haverá bastardos,
mas posso também firmar que não te serão por mim apresentados

Enfim termina neste dia, o verdadeiro que tentei ser-te.
Ser-te-ei mais perfeito e útil, menos eu, mas menos inútil.
Deseja-nos sorte, vamos precisar
Tu tão tu e eu tão nada
temos ainda tanto que caminhar…

… que falta

escolho o fácil: deixar que a vida me viva em vez de eu a ela

Queria chorar, mas já não sei
estou tão fraco, quase a implodir
Queria afagar-me no teu colo, mas sei que o faria por egoísmo,
nem sequer prefiro o teu colo, apenas o escolho por ser o mais fácil
devia acabar-nos, mas não tenho força nem tu vontade.

Estou igual aos outros, sem força para seguir o caminho que sei certo, mas difícil
por isso escolho o fácil: deixar que a vida me viva em vez de eu a ela

Os pensamentos encarquilham-se-me e parecem querer enganar-me.
A mim! Que nunca antes deixava que o Ego me levasse a melhor!
…agora deixo e nem me importo.
Vivo de cor e salteado, sou um verdadeiro sábio, adivinho tudo o que vão dizer e já tenho a resposta programada antes da pergunta ser feita!

Vou inscrever-me num clube de qualquer coisa e competir para ser melhor que os outros, não importa em quê, o que importa é que esteja ocupado e que o meu prodigioso intelecto se concentre em alguma coisa que não isto. Tenho a certeza que vou ganhar – ganho sempre! Mas depois vou concorrer rapidamente a outra coisa qualquer, para ter que me concentrar de novo..
Depois, quando finalmente tiver a paz enganadora da falta de vontade, vão todos homenagear-me, dar-me comendas e discursos bonitos, talvez até me façam um busto de bronze! Todos vão achar que fui muito importante e exemplar – até eu! …mas só até ao penúltimo momento da vida, porque aí…
Aí vou perceber o que realmente é importante, aquilo que até os parvos sabem, mas que a minha fantástica mente não terá alcançado até então.

Março 2006

Best of luck.

You worry me.

You say you don’t love me, and that’s good because I moved on and I no longer include us in my future. Yet, too often I find you passing at my door… by chance, as you always say.

Do not fool yourself; you are really the most interesting person I know, and you have so many things that no one else even grasps (those lips!), but I also decided that I would forget you and if there are decisions that have to be respected are the ones I do myself. This also I learned from you.

What I mean by this is that the interest I have for you is completely unselfish and it doesn’t even cross my mind that we will, someday, have any involvement beyond the great friendship I’m hoping will be everlasting.

That said, I really want to confront you with the awkwardness that your constant presence causes.

You’re in the bakery where I usually go at 8:00, then “accidentally” you show up wherever I lunch, no matter the place. And, on the rainy days – which are not few – I found you waiting with an umbrella ready to give me a ride. I always try to resist, but you end up convincing me. You take me home and always give me wise, yet annoyingly patronizing advices. I always end up feeling better.
Your magic still works, you always make me fell good.
Then we say goodbye and I feel your eyes on my back while I walk home. Then I’m relieved because I resisted kissing you.

Then, when everything goes well, I don’t remember you all day, I hang out with my boyfriend – who has a lot more time for me than you ever would have… And this thought makes me think about the sacrifices you probably have done to give me a ride. I know that you have every minute of the day accounted for, and that’s the very reason why we didn’t work.

You yourself said you where never there when I needed. It’s true. The endless days I suffered by not knowing of you, longing for your enormous hug …
Now I don’t have it’s comfort – which is unmatched, but also do not suffer for not having it, because the comfort I have, however smaller, is mine.

I think that’s why the greatest love stories never last. They’re necessarily fatal. A great passion cannot survive, because it consumes everything around it. At most it can become a happy love. That is a huge blessing, and I have it.

I have to thank what you where and always will be to me. That’s why I’d like you to be as happy as you look, or as you turned me into.

Sometimes can you deceive me and seem genuinely happy, but it can never last long.

I know I cannot have great importance in your life, but still I want you to know that your happiness is very important to me and to so many people you inspire. You know you’re a point of reference, odd, but still an example. Examples must be happy so that we, ordinary people, can also believe that we can be happy.

I wish you happiness.

Está a dar a nossa série….

Está a dar a nossa série, naquele canal estranho da televisão por cabo.
Não estás aqui. Há tanto tempo. Faltas-me. E eu a ti.
Serei medroso? Demasiado ambicioso? Ou simplesmente parvo?

Hoje sou só metade do que quer que seja.

Nov/2009

Carta de desapego

O tempo é-me muito barato.
Atiro-o por aí, sem razão, sem motivo, sem padrão sequer.
Dizem os sábios que quando as coisas nos saem do corpo,
têm mais valor.
Não têm.
Tudo o que me sai, sai do corpo.
O que sai da alma… isso sim, tem valor.
Mas eu não tenho profundidade, sou tudo o que se vê,
sou mais nada do que o que se vê.
Uma cigana quiromante disse que as linhas da minha mão
são apenas linhas, revelam nada.

Não tenho segundas intenções,
mas não tenho intenções.
Tenho a espessura de uma folha de papel
Sou sem nada, desalmado.

Escrevo-te assim porque, ainda que não tendo qualquer direito ou influência sobre ti, quero retirar-te qualquer peso que possa entravar, por menor que seja, a tua procura por felicidade.

És boa, das que desequilibram o mundo para o lado da esperança e da Alegria.
Só de imaginar os teus olhos abertos para os meus, fico com vontades, esperanças, planos para conquistar o mundo. Mas depois imagino-os a olhar os meus e vejo neles a desilusão de te falhar.
Não consigo ser responsável pela morte dessa Alegria.
Quero-te melhor do que o que terias perto de mim.

Agora, quando desisto de ti, descubro que a magreza que julgava do meu coração, pode implodir ainda mais.
Já não sou fino, plano, sou só um ponto.
Um ponto não pode ter nada a dizer.